Em cadeia na Bahia, presos têm cerveja e até churrasco

Um churrasco entre amigos, com direito a foto com pilhas de cerveja e carne na churrasqueira. A cena seria comum, não fosse o endereço: a festa foi na Penitenciária Lemos Brito, em Salvador, uma das cinco piores de todo o Brasil.

Em outra imagem, um preso posa com uma esteira e uma bicicleta ergométrica, privilégios dos "frentes" -ou chefes dos pavilhões. Algumas celas têm liquidificador e ventiladores. As fotos, encontradas por agentes penitenciários em celulares apreendidos em 2014, expõem como os chefes gozam de regalias impensáveis em outras unidades do país e mesmo entre os 1.315 homens que cumprem pena na Lemos Brito, unidade superlotada onde caberiam 771.
Ilegal, a prostituição na unidade ocorre após negociação entre os próprios presos, segundo Reivon Sousa Pimentel, presidente do Sinspeb (sindicato dos agentes penitenciários da Bahia). Como apenas mulheres dos detentos podem fazer visitas íntimas mediante um cadastro, presos sem cargos na hierarquia do crime vendem o nome aos chefes. Assim, com o nome de quem "cedeu" o privilégio, as prostitutas passam pela portaria sem dificuldade e, dentro da prisão, "trocam" de marido para fazer o programa com o cliente real.

Segundo o sindicato, também há livre entrada de pilhas de refrigerante, de frango, de feijão e de carne. A mercadoria é vendida pelos próprios presos nos "barracos", as lojas improvisadas. "Até caminhão-baú fechado entra no complexo e ninguém revista", diz Pimentel, para quem há conivência da direção da unidade como moeda de troca para evitar rebeliões. O governo da Bahia não comentou essa acusação.
Arremesso de bola

As encomendas que não entram com tanta facilidade com a visita de parentes são arremessadas para o interior da penitenciária. Comparsas dos presos se aproximam dos muros e atiram itens como aparelhos celulares, drogas e cigarros embrulhados. "É o arremesso de bola", ironiza o promotor de execução criminal de Salvador, Edmundo Reis.

O Ministério Público Estadual instaurou inquérito civil para apurar as condições gerais da unidade. O procedimento deve resultar em uma ação civil pública que poderá, em última instância, pedir até a interdição da cadeia. Para o promotor Reis, a fragilidade física do prédio, parte dele dos anos 1950, soma-se à superlotação e à falta de controle do governo estadual na gestão do presídio. O governo da Bahia afirma que a Lemos Brito tem passado por reformas e que o complexo da qual faz parte ganhará mais duas unidades, com obras em fase final.
Outro lado

O governo diz considerar que a Bahia "encontra-se em situação bem melhor do que os demais Estados" e que planeja migrar os detidos em delegacias para os presídios em ampliação.

Sobre regalias dos presos, o governo diz: "Há nessas denúncias [do sindicato] um pouco de exagero", sem detalhar o que achou equivocado. Em termos gerais, a nota diz que, no passado, já houve casos de divulgação de "fotos falsificadas ou antigas" -o texto não aponta quais seriam essas situações irreais. No texto, o governo reconhece que há arremesso de objetos para dentro da penitenciária Lemos Brito e afirma que está instalando grades altas, com tela de aço, e que estuda erguer outros muros no complexo

Fonte: Folha de São Paulo

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