"Brasil virou terra arrasada, e parece não haver saída sólida à vista", por CLÓVIS ROSSI



Artigo na edição de quinta-feira na FOLHA DE S. PAULO

Evaristo Sá/AFP
Manifestante mascarado invade Ministério da Fazenda em protesto contra reforma da previdência

Ao vencer as eleições de 2002, Luiz Inácio Lula da Silva cunhou uma dessas frases de efeito que ficam para sempre (tanto que foi repetida por vários outros vencedores em pleitos de outros países): "A esperança venceu o medo".
Claro que havia algo de marquetagem na frase, mas havia também uma boa dose de verdade: para a maioria (relativa) do eleitorado que votou em Lula, a esperança de dias melhores derrotara o medo que a outra quase metade sentia pela ascensão de um político que, àquela altura, parecia de esquerda.
Naquele ano, o público estava de fato à procura do "novo", seja lá o que signifique essa palavra.
Tanto que começou o ano inclinando-se para Roseana Sarney, que liderou as pesquisas até ser abatida por um bolo de dinheiro encontrado no seu escritório.
Aí, o "novo" tomou o nome de Ciro Gomes que acabou enforcando-se na própria língua comprida, ao contar mentiras tolas.

Sobrou Lula. Ganhou.
Agora, no entanto, na véspera de um novo ano eleitoral, a lama revelada pela Lava Jato sepultou qualquer expectativa de que alguém possa de fato encarnar a esperança.
É verdade que Lula continua liderando as pesquisas, mas a rejeição a seu nome é maior do que a porcentagem dos que dizem que pretendem votar nele. Parece mais um voto na base do "não tem tu, vai Lula mesmo".
Que "não tem tu" mesmo, demonstra-o a famosa Lista de Janot, a sequela. Não deixa pedra sobre pedra entre os grandes partidos e mesmo entre alguns médios (com o detalhe de que só vazou parte mínima dos que estão na relação).
É verdade que convém sempre ressalvar que acusados não são necessariamente culpados.
Mas a desmoralização da classe política é tamanha —no Brasil como na maior parte do mundo— que figurar na lista já é uma condenação, aos olhos do público.
Pela lentidão com que se move a Justiça, é razoável supor que o Brasil chegará à eleição nacional de 2018 sem que se tenha, em vez da "lista do Janot", a lista dos condenados pela Justiça e, como tal, inelegíveis.
Sobra, é verdade, o PSOL. Mas não parece que um partido de esquerda tenha reais chances de eleger um presidente em um país (e um mundo) que caminha, ao contrário, para a direita.
Sobra também Marina Silva, mas ela escolheu ser invisível, o que é imperdoável quando o país vive não só a sua maior crise política como a sua maior crise econômico-social.
Sobra, enfim, Jair Bolsonaro, que já esboçou um slogan eleitoral poderoso, na sua (lamentável) entrevista à Folha, quando disse que pode ser acusado de tudo, menos de corrupto.
Acho que ele merece todas as acusações que lhe fazem (e até algumas ainda a serem feitas), mas não estar na lista da Lava Jato acaba sendo um espécie de colete à prova de bala, para usar uma analogia adequada ao linguajar do deputado.
O fato é que o Brasil virou terra arrasada, na política e na economia, e não está à vista uma saída realmente sólida nem quem possa encarná-la.
É desolador, ainda mais que o público parece apático, como se a esperança, a última a morrer, estivesse morta.

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